
O Canto da Cidade dialoga com Pérola Negra, que dialoga com Samba Presidente e que se apresentam para Daniela Mercury pedindo proteção e defesa e ela o faz. Nesta entrevista exclusiva, que ocorreu durante uma micareta em Salvador, a cantora assume, mais uma vez, seu amor ao Brasil, e a necessidade do povo brasileiro se amar mais!
CJMartim: Em 1991, você cantava ‘Geração Perdida’, música emblemática em sua carreira, que falava da geração que sofreu a ditadura militar e tava tentando renascer com dificuldades. O Canto da Cidade, em 1992, você surgiu no Brasil e deu uma injenção de ânimo na população que vivia tormentos na era Collor, Hoje, em 2018, qual é o novo Canto da Cidade que as pessoas precisam para que acordem, voltem a recuperar a sensibilidade em meio a tanta intolerância que passamos?
Daniela Mercury: Todas as canções de empoderamento negro que eu fiz na minha vida valem para agora, que muita gente escutou, mas talvez não tivesse a percepção de quanto essas canções eram necessárias. O Canto da Cidade se ressignifica, Samba Presidente tem esse intuito de dizer “na minha casa palavra é tambor, sílaba batucada, quem não entende o som, não entende o tambor, não entende o amor, não entende nada” falando que o povo brasileiro é realmente o presidente desse lugar, mais uma vez eu digo isso, é o que eu sempre disse em todas as canções, a gente sempre perde a noção do poder que a gente tem conosco.
Eu acho até que essa confusão toda, esse tempo sombrio, esse tempo que a gente viu florescer ódios e raivas e racismos inaceitáveis, e discursos completamente em desacordo com tudo que a gente acredita, como população, como seres humanos de valor, de direitos humanos, tudo que eu acredito que a maioria quer que aconteça, que é paz, amor, convivência… nesse momento que surgem esses sentimentos ruins em tanta gente, eu acho que realmente é o momento da gente trazer doçura, paz, apaziguar, unir, que a arte tem que fazer esse papel, de amor. Lógico que as canções dizem muito, às vezes as pessoas não prestam tanta atenção as canções, na letra, mas de alguma forma essas canções ficam.
Banzeiro foi minha forma abstrata de unir o Brasil, porque já no carnaval passado, estávamos com essa dificuldade de nos entender através das palavras. Ai, eu peguei uma canção que dizia palavras que ninguém entendia pra que cada um significasse o que quisesse, botava significados nessa palavra, priprioca, pororoca, banzeiro, uma mistura de águas , porque Milton Santos disse que “um povo que faz festa é superior a quem não faz”, quando a gente não resolve as questões pela racionalidade, a gente tem que resolver no bate papo, no encontro, no corpo a corpo, no olho no olho, acho que o brasileiro precisa confiar mais um no outro, fazer mais declarações de amor ao nosso povo, porque quem ta com tanta raiva, também ta com raiva do Brasil, também ta com raiva do povo brasileiro., também estar jogando maldições, aquela maldição que eu brinquei em Rainha Má, que eu chamei atenção “cuidado, que o povo brasileiro fala mal de si, fala mal dos índios, dos negros, fala mal das religiões afro brasileiras, falam mal dos gays, isso faz mal para todo mundo porque a gente vive na diversidade, vivem em cidades grandes, no país com 230 milhões de pessoas, e a gente não pode se amaldiçoar. A gente tem que fazer coisas positivas.