Quem é viciado por série deve ter visto “Todo Dia a Mesma Noite”, da Netflix, que conta o horror do incêndio da Boate Kiss, que chocou o país. Bruno Sigrist, nosso entrevistado, interpreta o dono da boate. Mas reduzir o personagem a vilão é um erro. Na conversa, ele comenta sobre os desafios desse trabalho, o que pensa sobre contrato por obra- que ainda choca o público, além de suas ambições como artista.
Cjmartim: Buscou alguma terapia para trabalhar na série da Netflix [“Todo Dia a Mesma Noite”] sobre a tragédia da Boate Kiss? O assunto é extremamente pesado e tenso.
Bruno Sigrist: Terapia eu faço há anos. Acredito que qualquer pessoa que trabalha nesse meio – artístico, do entretenimento – tem que estar com a terapia em dia. Mas nesse caso, a experiência me ajudou. Meu primeiro trabalho profissional, na vida, foi de um rapaz que se matava, em cena (no musical “O Despertar da Primavera”, dirigido por Charles Moeller e Claudio Botelho). Foi lá que entendi como é importante saber deixar o personagem lá, no palco ou no set, e não levar ele pra casa. Com a Boate Kiss o buraco é mais embaixo? Sim, porque é um fato real e que nós testemunhamos! Tanto que após cada gravação eu me via, o resto do dia, introspectivo e ainda um tanto “carregado” pelo peso daquela história.
Cjmartim: O Globoplay produziu o documentário “Boate Kiss. A Tragédia de Santa Maria”, com depoimentos reais dos familiares. Chegou a ter contato com os parentes das vítimas ou do dono da boate?
Bruno Sigrist: Por orientação da própria Netflix, nos foi pedido para evitar tomar iniciativa de contato com as famílias, por se tratar de um assunto delicado e ainda muito dolorido para eles. E concordo, acho que nessa situação todo cuidado é pouco. Mas deixaram claro também que se fossemos procurados por eles tínhamos total liberdade para interagir, sempre com muito cuidado.
Cjmartim: Musicais ainda são associados a algo de elite no Brasil? Como surgiu o convite para integrar um? [o ator se encontra em “Anastasia”, em cartaz em São Paulo]
Bruno Sigrist: Ah sim, com certeza, infelizmente. Acredito que o valor dos ingressos está sim distante da realidade da grande maioria. Mas, ao mesmo tempo, os projetos apoiados por leis de incentivo têm várias ações de contrapartida social, o que na prática significa que uma boa porcentagem dos ingressos do teatro têm que ser dados a ONGs e instituições filantrópicas, que os distribuem, ou são vendidos a preços populares. No “Anastasia”, musical que estou fazendo e está em cartaz até 7 de maio no Teatro Renault, em SP, temos ingressos a R$25 reais.
O que acontece é que as pessoas infelizmente acabam nem sabendo da existência disso. Tive o prazer de levar à plateia de um dos musicais que fiz (“Les Misérables”), em 2017, alunos da escola municipal onde minha tia trabalhava e aquela foi, para muitos ali, a primeira vivência em teatro, da vida. Nunca tinham pisado em um! Um deles chegou a perguntar se aqueles, ali na frente, eram pessoas de verdade, acredita?
Cjmartim: Muitos atores, atualmente, preferem contratos por obras. O mercado se encontra bom para o ator não sentir necessidade de um contrato mais longo?
Bruno Sigrist: Acredito que isso dependa muito de quem é o ator. Um contrato longo, de vários meses ou até anos, garante sim uma paz. Mas talvez para aquele que já tem uma trajetória consolidada e a quem não faltam oportunidades, seja uma liberdade maravilhosa. Eu adoraria ter um contrato de cinco anos com uma emissora, com direitos trabalhistas, plano de saúde, etc… (risos). Mas não posso dizer que não gosto de fazer de tudo um pouco. Faço séries, musicais, comerciais de tv, dublagens, dou aulas… Nunca fico entediado!
Cjmartim: Qual é a sua maior ambição como ator?
Bruno Sigrist: Minha maior ambição como ator é fazer parte de uma série de TV e/ou filme de Hollywood. Acho que não existe nada que chegue nesse nível, tanto financeira como artisticamente.
cjmartim.com 